A artroplastia do quadril é uma das melhores cirurgias da medicina, mas devemos lembra que é uma substituição de uma articulação doente por componentes mecânicos e, como todo componente mecânico, estão sujeitos à desgaste ou condições adversas de funcionamento.

A artroplastia do quadril provavelmente não vai durar toda a sua vida e quanto mais precoce for a sua idade, maior a chance de novas cirurgias. O grande problema é que os afrouxamentos ou desgastes são silenciosos, isto é, não apresentam sintomas no início do quadro. Devido a isso, indivíduos com artroplastia do quadril necessitam acompanhamento médico periódico.

O termo “revisão” subestima muito o porte da cirurgia. Quando ouvimos esse termo, parece que estamos fazendo avaliações e substituições banais de peças, mais ou menos como levar o seu carro no mecânico e ver se está tudo bem. Na verdade, é bem ao contrário disso.

Radiografia do quadril esquerdo com migração do componente acetabular para dentro da pelve.

A revisão da artroplastia do quadril é, entre as cirurgias do quadril, a cirurgia mais complexa. Muitas vezes precisamos retirar as artroplastias prévias parcialmente fixas ou fixas. Essa etapa envolve muitas táticas, como as osteotomias femorais, por exemplo. Após a retirada da prótese prévia, precisamos reconstruir os defeitos ósseos existentes, muitas vezes graves, com enxerto ósseo ou outros dispositivos ortopédicos disponíveis (anéis de reforço, cunhas, entre outros).

Radiografia pré-operatória (esquerda) observando-se completo afrouxamento além da mudança da posição do componente acetabular prévio; radiografia pós revisão da artroplastia do quadril (direita) com utilização de enxerto ósseo e anel de reforço para o acetábulo.

 

Tipos de afrouxamento

As artroplastias do quadril podem sofrer dois tipos de afrouxamento, um asséptico e outro séptico, isto é, causado por infecção.

O afrouxamento asséptico (sem infecção) ocorre devido ao desgaste dos componentes da artroplastia, mais provavelmente do polietileno, mas também pode ocorre pelas forças torcionais ou de torque que ocorrem sobre os componentes da prótese no nosso dia a dia.

O afrouxamento asséptico habitualmente cursa com grandes defeitos ósseos que aumentam com o tempo e isso é fácil de compreender. Imagine um prego fixo em uma parede e que, com o passar do tempo, comece a sofrer movimento. Se nada for feito, o defeito na parece aumenta, até o prego se soltar completamente. Tudo que queremos evitar no afrouxamento da artroplastia é que o defeito ósseo aumente significativamente. Isso traz um grande desafio, aumenta muito a complexidade da cirurgia, bem com aumenta a taxa de complicações e torna a cirurgia mais agressiva para o paciente.

O afrouxamento séptico é aquele que ocorre devido à infecção na artroplastia. Quando pensamos em uma infecção qualquer, imaginamos febre, alterações dos exames de sangue, entre outros aspectos. Isso não é a realidade para a artroplastia do quadril. A maioria dos casos são difíceis de diagnosticar. Quando ocorre a infecção aguda, onde há vermelhidão acentuada na ferida operatória, febre e dor no quadril, o diagnóstico é mais fácil. No entanto, a maioria dos casos não apresenta febre. O sintoma principal é dor. Esse tipo de diagnóstico exige alta suspeição pelo ortopedista. Em outras situações, ocorre a presença de fístulas, com drenagem se secreção no trajeto da ferida operatória ou próximo do quadril. Esse é um sinal inequívoco de infecção na artroplastia do quadril.

 

Quando suspeitar que minha prótese está com problema?

Uma artroplastia, em sua evolução normal, apresenta rápida melhora da dor no período pós-operatório imediato. Há uma melhora da função do quadril significativa nos primeiros 30 a 45 dias. Qualquer interferência nessa evolução habitual deve ser muito bem avaliada.

Dor intensa ou persistente na artroplastia do quadril é um sinal de alerta. A falha mecânica, pura e simples, em um período menor que dois anos da cirurgia inicial não é a regra. Se ocorre, haverá suspeita consistente de afrouxamento séptico.

Adequadamente, sua artroplastia do quadril deverá ser avaliada periodicamente, por radiografias e clinicamente, no primeiro ano. Após isso, pelo menos uma radiografia deveria ser feita anualmente ou a cada 18 meses. Procedendo dessa maneira, podemos identificar sinais radiográficos de afrouxamento, habitualmente se repercussões clínicas, isto é, sem dor.

Outros sinais de que sua prótese está sofrendo são o encurtamento progressivo e gradual do membro inferior do quadril operado. Nessa situação, pode estar ocorrendo a migração da haste femoral ou do componente acetabular.

Outro sinal de risco é a luxação frequente da artroplastia do quadril. A luxação pode decorre da mudança do posicionamento dos componentes da artroplastia (por afrouxamento) ou por desgaste de algum deles.

 

Tipos de cirurgia

Se o desgaste ou afrouxamento de algum (ou ambos) componente(s) da artroplastia são identificados e não há significativo desgaste ósseo (osteólise), muitas vezes é possível a substituição simples do componente danificado. Essa é a importância do seguimento atento no pós-operatório dos pacientes com prótese de quadril: identificar o degaste precocemente.

Quando existe o afrouxamento associado com desgaste ósseo e formação de grandes defeitos ósseos, é imperativo a correção desses defeitos pelo uso de enxerto ósseo ou substitutos ósseos, ou pelo uso de peças metálicas que façam a vez do enxerto ósseo.

Também temos que saber que a retirada da prótese anterior é um passo crítico para a cirurgia. Muitas vezes um deles ou ambos podem estar fixos. Nessa situação, há necessidade de utilizar osteotomias, para a sua retirada ou a retirada do cimento existente.

Quando nos deparamos com uma artroplastia do quadril com afrouxamento decorrente de infecção, podemos optar por duas alternativas: revisão em um tempo e revisão em dois tempos.

A revisão em um tempo pressupõe a retirada da artroplastia infectada, a limpeza cirúrgica rigorosa e a recolocação de uma nova prótese no mesmo ato cirúrgico. Existe uma probabilidade de sucesso em torno de 85% a 90% nessa forma de tratamento. Essa é a nossa técnica de preferência nos casos de artroplastia do quadril infectada.

A revisão em dois tempos pressupões a retirada da artroplastia infectada, a limpeza cirúrgica rigorosa, a colocação de um espaçador (dispositivo que simula uma prótese) e, após um período variável, nova cirurgia para remoção do espaçador e colocação da prótese definitiva. A taxa de sucesso fica em torno de 90% no controle da infecção.

É importante compreender que toda revisão da artroplastia do quadril deve ser considerada sempre infectada. Isto é, devemos verificar, pela coleta de material durante a cirurgia, se o afrouxamento ocorreu ou não devido à infecção.

 

Complicações

As complicações são similares às da artroplastia total do quadril, porém com uma frequência bem maior. Os casos de infecção podem ocorre em cerca de 10% dos casos.

A luxação ou deslocamento da artroplastia são bem mais frequentes, atingindo 20% em alguns relatos da literatura. Muitos fatores estão associados com esse alto índice, principalmente as contraturas, as deficiências musculares e os impactos ósseos.

Fraturas transoperatórias do fêmur e/ou do acetábulo podem ocorrer devido à fragilidade óssea encontrada nesses casos.

Diferenças no comprimento dos membros inferiores são também mais prováveis, podendo o lado operado permanecer mais curto ou alongar.

Os afrouxamentos ou as falhas das reconstruções nas revisões da artroplastia também podem ocorrer. Sabe-se que quanto maior o defeito ósseo prévio e maior a reconstrução necessária, maior também a chance de uma nova falha.